domingo, 20 de setembro de 2009

UM MONSTRO À SOLTA

(Fonte barcelonadream.blogs.sapo.pt)

Com essa minha imobilização temporária (creio eu), tenho ficado muito em casa, o que para mim é um tormento, pois, como dizia a minha mãe, eu sou muito “rueira”.
Mas essa semana eu tive alguns compromissos e meus filhos e marido serviram de motorista, o que me permitiu passear e observar as ruas, as praças, os lugares por onde passava.
Levei foi um grande susto!
Logo na pracinha de Jucutuquara* quando olho para o lado da antiga fábrica de tecidos, cadê a casa dos “donos” da Braspérola? Sumiu! Só sobrou o muro... Mas como a Prefeitura destruiu a antiga fábrica dizendo que ia fazer um espaço de artes e eu só enxergo a fachada e um grande vazio atrás, pensei com meus botões, vai ver a prefeitura também comprou a casa e vai fazer alguma coisa boa para a comunidade, mas precisava derrubar aquele casarão antigo tão lindo?
Seguimos em direção ao centro da cidade e logo depois da curva do Forte São João, outro susto, onde já haviam derrubado o velho Restaurante Universitário, agora sumiu também a casa da frente, uma que tinha lindas janelas verdes.
Na volta, passamos por Bento Ferreira e as casas lá também estão sumindo do dia para a noite. Você passa a casa está lá, dois ou três dias depois, ela some inteirinha. O mesmo está acontecendo na Praia do Canto. Isso porque meu passeio se restringiu a esses bairros, imagino o que não estará acontecendo por toda a cidade!
Logo nós, capixabas, que temos como característica a utilização de casas, prédios, pontos comerciais como pontos de referência, o que iremos fazer se estão destruindo tudo?
Olho aquelas paredes que sobram e vejo azulejos brancos, algumas partes com azulejos coloridos, intermediados de paredes de cores diversas e fico pensando o quanto de história está sendo jogada no lixo. Quantos segredos aquelas paredes ouviram. Juras de amor. Brigas pra nunca mais que duravam poucas horas. Primeiros choros de bebês que nasceram rodeados dos que mais os amavam. Casos de vida e de morte.
Parte da minha história, na cidade do interior, já foi devorada e lhes digo, a sensação não é nada boa. Onde antes havia uma cozinha com cheiros que se acessavam a um olhar, hoje só sobrou chão.
Minha conclusão é que tem um monstro à solta comendo nossa história.
Acho que ele se alimenta das lembranças que ficam abrigadas nas antigas casas, por isso, à noite, ele sai e as devora.

*Jucutuquara - 0 nome Jucutuquara, JUCU-ITA-QUERA, é de origem indígena e significa "pássaro do buraco de pedra" ou YTICUTUQUARA, que significa "conchas suspensas", condizentes com a forma dos buracos da "Pedra dos Olhos" localizada na área e batizada pela própria natureza. As mutações lingüísticas fizeram valer a linguagem popular: Jucutuquara. Nome da antiga fazenda que havia no lugar, pertencente à família Monjardim, século XIX.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

NENHUM JURAMENTO É ETERNO


Quando pensei em escrever esta crônica a primeira coisa que me veio à cabeça foi um “pedacinho” de uma música da Dolores Duran, onde ela cantava:
“...Tem gente que jura que não volta mais
Mas jura sabendo que não é capaz.”
Pois é, quase ao mesmo tempo que aprendemos a falar aprendemos, também, a fazer os mais diversos juramentos.
Na minha infância, quando umas palmadas ainda eram método de aprendizagem e eu aprontava alguma (o que não é nenhuma novidade!), logo que era pega, para escapar das ditas cujas, jurava, no ato, nunca mais repetir aquela arte.
Depois, já na escola de catecismo, aprendi a acrescentar o “juro por Deus” e meus pais acabavam me perdoando mesmo sabendo que eu iria repetir a ação na primeira oportunidade.
Lembro dos banhos de cachoeira, sempre às escondidas, e as palmadas e castigos porque meu pai dizia que eu ia “pegar caramujo” (esquitossomose), o que não deu outra, eu apanhava, jurava não repetir, e depois fazia tudo outra vez achando que os cabelos molhados não iriam me denunciar.
E assim a vida ia passando.
Quando quase fui expulsa do colégio, de tanto aprontar, jurei que me tornaria comportada igual à minha irmã. Mesmo todos sabendo que era a maior mentira da paróquia.
Quando o grande primeiro amor acabou, só do lado dele, porque amor não combina de acabar dos dois lados ao mesmo tempo, jurei nunca mais amar, doía muito. Até que durou um tempinho... rs, mas voltei a amar, ainda bem!
Nas dores do parto jurei não ter mais filhos... juramento que durou um ano e pouquinho, graças a Deus!
Isso só para ficar nos juramentos mais marcantes.
E de juramento em juramento fui levando a vida.
Aqueles que me acompanham mais amiúde, devem lembrar-se o quanto sofri quando o Thunder, cão da Gabi, morreu. (http://katiamultiplasfaces.blogspot.com/2008/09/menina-e-seu-co.html)
Jurei, então, que nunca mais ia querer mais nada na minha vida que respirasse. Isso porque marido e filhos não requerem cuidados especiais para sobreviverem.
Bati o pé e repeti mil vezes que não aceitaria mais nenhum animal. Era trabalho demais, gasto demais, sofrimento demais, sem contar que acabava prendendo a gente em casa.
Pois bem, sexta-feira, hora do almoço, chego da fisioterapia e encontro um filhote de cachorro na minha área de serviço. A cadela que vigia a obra de um empreendimento do qual meu marido é sócio havia dado cria a 9 filhotes e estavam todos morrendo ou desaparecendo, meu marido, com dó do cachorrinho, trouxe-o para casa. Quando bati os olhos naquele olhar de cão abandonado, meu coração se encheu de piedade e não tive coragem de mandá-lo embora.
Mais um juramento quebrado.
Nossa casa e nossos corações agora abrigam um dalit (ele é tão bonitinho que não merece ser chamado de vira-lata) que já está até aprendendo a atender pelo nome que, para seguir a linhagem, Thunder, Flash... e como ele não é bramani, ficou sendo Chuvisco mesmo.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

PORQUE RIR AINDA É O MELHOR REMÉDIO...

Estação de trem, metrô, etc em Berlim

OU PODERIA SER MAIS UM DA SÉRIE “COISAS QUE SÓ ACONTECEM COMIGO”
Estávamos nós em plena Europa, eu, meu marido e nossos vizinhos.
Cabe um parêntesis para que vocês compreendam as reações que virão, eu e eles somos amigos desde que nascemos, freqüentamos as mesmas escolas, moramos na mesma rua (é certo que na nossa cidade só existiam três principais, rs), seguimos nossas vidas juntos e eu os considero como irmãos, daí termos a intimidade que muitos irmãos consangüíneos não têm.
Já havíamos viajado por quase um mês, passeado bastante, rido bastante (dos outros e de nós mesmos) e, principalmente, comprado um monte de tranqueira. Para vocês terem idéia eu tive coragem de comprar uma chaleira e um escorredor de macarrão, logo no início da viagem, na Alemanha, e carregá-los pela Itália e França afora, sem contar a volta pela Alemanha... só coisa de brasileiro doido, ou seja, euzinha! Mas enquanto ele me zoava por causa da chaleira, eu o lembrava que no fundo de sua mala tinha dois serrotes!
Ainda no Brasil nós havíamos conseguido comprar passagens aéreas Milão-Berlim a preço de banana. Como fizemos todo o percurso em terras estrangeiras de trem, este foi o único trecho que necessitamos de avião para cumprirmos o roteiro que nos propusemos.
Tudo uma maravilha. Até que chegamos ao aeroporto de Milão. Embora tenhamos usado de todos os artifícios (bolsas de mão enormes, homens com mochilas, etc.), o peso de nossa bagagem excedeu um absurdo e lá fomos nós, depois de muita negociação, pagar o excesso: saiu mais caro que as passagens! Levamos na esportiva e seguimos em frente.
Ficamos uns dias em Berlim e depois seguimos para Frankfurt, de trem. Eu e o Roberto tínhamos duas malas (pesadíssimas), duas mochilas, uma bolsa de mão e mais minha bolsa pessoal, tudo isso para colocar dentro do trem – uma peripécia e tirar depois – outra maior ainda! Resultado, quando, enfim, chegamos ao aeroporto, despachamos as bagagens, etc. e tal, o Roberto estava tão suado que era impossível viajar quase doze horas naquela situação. Bem à nossa frente tinha uma lojinha da Nike, então eu disse: - Vocês me esperam aqui, eu vou à loja, compro a camisa mais barata que encontrar, volto, o Roberto vai ao banheiro, se lava e troca de camisa. Lembrei de um desodorante que eu havia esquecido na bagagem de mão e daí ele aproveitava para usar e jogar fora, porque eles não estavam aliviando quanto ao embarque de líquidos.
Estava eu no interior da loja quando, ao virar-me, um homem alto, afro-descendente, esbarra em mim e, educadamente, diz: - Sorry!
Ao mesmo tempo meus dois neurônios se ligaram e mandaram a mensagem de que eu conhecia aquela pessoa. Então respondi: - Não foi nada, pode falar em português mesmo!
Nós então, entabulamos uma conversa:
- Brasileira! Que alegria! Está chegando ou partindo?
- Estou indo para o Brasil e você?
Ele olha para mim com aquele olhar de “conheço você de algum lugar, mas de onde?” e eu, que perco tudo, mas não perco a pose, também fingi lembrar-me de onde o conhecia. Então continuamos conversando como velhos amigos que se encontram.
- Estou indo para Milão, disse ele.
- Acabo de chegar de lá, disse eu.
- Está muito frio?
- Não, está agradável. Quando você vai ao Brasil?
- Assim que tiver uma folga...
Nesta altura já estávamos na fila do caixa e a moça se desdobrando em amabilidades para atender-nos.
- Sinto muita saudade do Brasil,
- É assim mesmo, quando estamos fora do nosso país. Mas a gente acaba se acostumando, digo eu.
Pagamos e ele resolve olhar uns bonés, então nos despedimos:
- Tchau, foi um prazer te ver – disse ele.
- Tchau, também adorei te reencontrar, a gente se vê por aí – respondo eu.
Beijinhos para cá, beijinhos para lá, e eu saio da loja.
Encontro meu grupo e digo para eles, vamos ficar aqui, na moita, escondidos atrás desta pilastra porque vai sair um moreno alto da loja, que eu fiquei conversando um tempão, mas não consigo lembrar de onde eu conheço.
Assim fizemos. Estava meio dispersa quando, de repente, meu amigo me dá um safanão e pergunta:
- É aquele?
– Sim, sim, é... respondo.
E o meu amigo:
- É claro que você conhece, sua demente! Sabe de onde? Da televisão! É o Gilberto Silva, da Seleção!