Los Arcos - Placa do Cemitério
Deixamos Los Arcos cedinho, pois era uma caminhada de “duas botinhas”, na nossa leitura: muito difícil, e grande, pois até Viana seriam 18,5 km, de muitas subidas e descidas e cruzamento de asfalto, ou, se resolvêssemos ir até Logroño, seriam 27,9 km, só de trilha.
Meus pés ardiam, queimavam, vazavam, de tantas bolhas. Não conseguia encontrar uma explicação que não fosse mesmo uma prova pela qual teria que passar, prova essa que consistia em dor física, além das muitas dores da alma, uma vez que havia feito, com a mesma bota, a Trilha Inca, e não sofrido nada, nem uma bolhinha... mas, para o que não tem remédio, tem farmácia: descobri um arsenal de medicamentos e artefatos que ajudam os peregrinos e que ninguém havia me alertado do tipo: Betadene (um tipo de iodo que não deixa inflamar), álcool de peregrino (para massagear os pés), Compeed (uma espécie de emplasto acrílico que protege a área do pé que está na iminência de aparecer bolha ou calo), rolinhos de acrílico e espuma (que a gente compra e vai cortando do tamanho do dedo para proteção), etc... etc... Ou seja, não precisa ficar levando um tanto de esparadrapo, curativo, gaze, etc. porque é “peso morto”, à medida que precisar compra só aquilo que for necessário.
Logo na saída de Los Arcos tem um cemitério muito antigo, cuja placa diz “Eu fui o que você é, Você será o que eu sou”! Achei fantástico e logo parei para fotografar!
O Mauricio seguia na frente, o cemitério foi a deixa para ele deixar-nos para trás... ainda não sabíamos, de verdade, seu pavor por este “tipo de coisa”! rs
Seguimos caminhando, eu e a Cris... pensando, cantando, conversando...
Passamos por Sansol – onde não tem nada! Quer dizer, tem uma farmácia! E seguimos até Torres Del Río, famosa por sua igreja octogonal “Igreja do Santo Sepulcro”, similar ao Templo de Jerusalém, assim como Eunate, foi construída pelos Templários e é uma das construções mais interessantes de todo o Caminho, desde a entrada, com sua cruz patriarcal, passando pela cúpula, em forma de estrela de oito pontas, até seus capitéis em forma de serpentes, aves e centauros. Um dos aspectos que mais me chamou atenção foi a singularidade do Cristo crucificado, cujos pés encontram-se paralelos.
Torres Del Río - Iglesia del Santo Sepulcro
De Torres até Viana é um vai e vem de sobe e desce que eles chamam de “rompepiernas” – moleza! E assim seguimos, até chegarmos a Viana.
Havíamos planejado ficar no albergue de Viana. Encontramos Mauricio sentado perto da Igreja, bonita, por sinal, conversamos um pouco e ele se foi. Daí sentamos num barzinho, fizemos um lanche, tomamos umas “Cañas” espécie de chopp...
Parêntesis 1 – Eu atualmente não bebo quase nada, nem socialmente, e quando fui ao Caminho já não bebia, então, bastava um copo para ficar alegre, dois para ficar levemente alterada e três para ficar alcoolizada.

Viana - Iglesia de Santa María
Talvez por ser domingo, a cidade estava cheia de gente, muito movimento, e a gente desacostuma a isso... e também como era cedo, decidimos seguir até Logroño.
De Viana a Logroño é um trecho mais fácil, mas estava muito quente, o asfalto fazia derreter até os miolos... sombra era artigo de luxo... e eis que do nada nos aparece uma árvore, com um sofá... Tudo bem estava sujo, cheio de titica de pássaro, mas não resisti!
Torres Del Río - Logroño - Parada no Caminho
Quase chegando a Logroño, passa-se pela Casa de La Señora Felisa. Ela coloca um pequeno toldo em frente ao seu muro, com uma pequena mesa, e serve figos, água e amor a todos os peregrinos que passam, além de manter um caderno aonde os que se vão deixam recados para os que ainda vêm. A velhinha, de seus oitentas anos, à época, nos recebeu com o maior carinho, mas desconfiada do jeito que sou, e curiosa também, resolvi ler o caderno primeiro. Santa intuição! Havia um recado do Mauricio, cifrado, onde dizia para não comermos os figos. A Cris ou não deu atenção, ou não entendeu foi logo comendo, eu aceitei a água apenas... os figos são secos no sal! Carimbamos nossa credencial, agradecemos e seguimos com a Cris me amaldiçoando...
Chegamos a Logroño, cidade grande, o albergue fechado e nós, pobres peregrinos, debaixo de um sol escaldante, na fila, esperando a abertura.

Logroño - Catedral Santa María La Redonda
Voltamos a encontrar a Maria do Carmo (que havia caído mais uma vez e estava machucada), Ademir e Osmar.
Conhecemos a Maria do Socorro, de Brasília, Gente assim mesmo, com G maiúsculo! Amiga querida que jamais quero perder...
A Cris depois me contou que ficou super-sensibilizada quando soube que o rapazinho francês (ainda vou lembrar o nome dele) ajudou o Andrés (francês) a chegar ao albergue. O Ula-lá (apelido do Andrés, sim, dávamos apelidos a todos! Só entre nós, claro!) havia se sentido mal e o rapaz havia carregado as duas mochilas por mais da metade do caminho. Isso é um esforço sobre-humano, a gente mal agüenta com a própria mochila. Passei a admirar ainda mais aquele jovem. Pela coragem, pelo desprendimento, pela solidariedade.
Logroño, a cidade grande, tem uma característica das cidades da Espanha: aos domingos, as mães vestem suas filhas com aqueles vestidos que parecem bolos de casamento (na linguagem da Cris) e saem para passear na rua. Parece um bando de bolos correndo pela calçada e as mães correndo atrás para que não se sujem. É interessante, para não dizer um pouco cômico, ficar observando a diferença de comportamento. Se for para divertir, deixa as meninas sujarem as roupas... Parece que é só para exibir!
Naquela noite abri uma exceção e tomei um autêntico La Rioja!
Dormi o sono dos justos (e dos exaustos!)
Parêntesis 2: Sei que existe um ditado que diz que justificativas são desnecessárias, pois os amigos não necessitam e os inimigos não acreditam. Inimigos, se os tenho ainda não os conheço e não gosto de deixar meus amigos sem saber a causa dos meus “sumiços”. É que neste final de mês o jornal complicou e eu estou trabalhando na comissão organizadora da VII Jornada Médico-Espírita do Espírito Santo. Para completar, estou sendo “sugada” pela Gabi (minha “Sinhazinha”) para colocar o consultório em dia – trabalho escravo, na minha linguagem, na dela é trabalho voluntário! O que mãe não faz pelos filhos! Mas agora prometo visitá-los! Juro!