quinta-feira, 14 de agosto de 2008

DE UTERGA A PUENTA LA REINA

Ermida de Nuestra Señora de Eunate

Depois de uma noite mal dormida partimos em direção a Puente La Reina. Relativamente perto, pela trilha daria uns sete quilômetros. Porém, entre Óbanos e Puente La Reina existe uma igreja, Ermida de Nuestra Señora de Eunate, que eu queria muito conhecer e, para chegar até lá tem que pegar uma outra trilha e fazer como que uma curva grande até voltar ao caminho original. Mas valeu cada passo. Essa igreja, que não pudemos conhecer por dentro pois era segunda-feira e não abria (arre!!!!), foi construída pelos Templários, no século XII, fica entre o nada e o coisa nenhuma, ou seja, é um campo a perder de vista e a igreja no meio. Construção octogonal, reza a lenda que nenhum peregrino deveria deixar de visitá-la, apesar das bolhas nos pés, para poder ter assegurado que terminaria a peregrinação. Eunate, que significa “cem portas” em “euskera” dialeto falado nesta parte da Espanha, segue o desenho do Templo de Jerusalém e sua obra é carregada de simbolismo, como disse, um octógono dentro de outro muro octogonal, cheio de esculturas que vai de anjos a demônios.

Fizemos um pit-stop e retomamos a trilha.

Muruzábal é um povoado pequenino e tem uma igreja bonita, só isso!

Óbanos tem importância histórica (e muitas, muitas rosas) e um casario do século XIV muito bonito.

Em Uterga eu havia descoberto uma pequenina bolha no meu pé (a primeira, mas na minha ignorância julgava ser a única), então, durante a caminhada, meu pé começou a doer mais do que o normal. Como não tínhamos dormido quase nada, chegamos a Puente La Reina muito cansados e decidimos que não prosseguiríamos naquele dia. Meu joelho estava em frangalhos, meu corpo, um bagaço! O refúgio é aconchegante, grande, e nós logo estendemos nosso varal e eu decidi ficar no albergue para lavar roupa (diz Cristina que nunca viu nem homem lavar roupa tão esquisito que nem eu, para ser delicada!), descansar, enquanto Cris e Mauricio decidiram ir à missa.

Detalhe do Crucifixo - Cruz em forma de Y - Séc. X - Igreja em Puente La Reina

Fiz meu serviço e depois fui tomar banho. Foi minha primeira experiência com banheiro misto. Meio estranho, mas carreguei minhas coisas (inclusive uma toalha de rosto que o Mauricio me deu, porque eu esqueci a minha em Uterga, graças a Deus! menos um peso, já que a que ganhei era mais leve e apropriada!) e tomei meu banho, saí já vestida. Quando sentei no beliche e fui cuidar dos meus pés, descobri uma bolha grande na lateral. Daí não agüentei. Comecei a chorar, e muito. Foi quando chegaram o José Carlos e o Jairo, aqueles que eu citei no capítulo da Mme Debrill e eles tentavam me consolar, e eu só fazia chorar e dizer que queria a Cris e o Mauricio, eles já estavam a ponto de sair a procurá-los quando eles chegaram.

Acho que todo o choro que eu guardei nestes dias saiu de uma vez só! Chorava de dor, de impotência porque não havia nada que eu pudesse fazer a não ser “costurar” minhas bolhas (passar uma agulha limpa com linha de um lado a outro e deixar a linha, como que um dreno).

Neste meio tempo, sai um homem do banheiro, pela cor acho que era alemão, praticamente nu. Cristina quase desmaiou. O Mauricio ficou uma fera, quis brigar, disse que era falta de respeito, foi difícil contê-lo. Daí, quando conseguimos sossegar a fera, sai uma mulher, na faixa dos seus sessenta e muitos anos, enrolada numa toalha, aproxima do beliche, tira a toalha e fica nua, troca a roupa, como se estivesse sozinha no seu quarto. Foi então que nos demos conta das nossas primeiras e grandes diferenças, principalmente as culturais, e o quanto precisaríamos exercitar a paciência e aceitação do outro para que pudéssemos ter uma convivência pacífica.

Reencontramos Ana e Walter. Tivemos notícias de que Maria do Carmo e seus fiéis escudeiros estavam a caminho, e bem!

Puente La Reina (detalhe para sacolinha de compras: comida!)

Naquele dia, depois das compras (sagradas), espalhei minhas coisas na cama e comecei a descartar o peso inútil. Dei meu travesseiro para o Maurício, na caixa onde ficam os descartes do tipo "eu coloco o que não quero, você pega o que precisa", deixei shampoo, creme de cabelo, sabão de coco. A partir daquele dia era um só sabonete. Com ele eu lavava os cabelos, tomava banho e lavava roupa... e juro que meu cabelo nem reclamou!

Também abandonei o meu caderno, onde estava anotando algumas impressões e as fotos que tirava. Fiquei com apenas algumas folhas.

Foi difícil me desfazer dele... mas eu começava a aprender que no caminho, como na vida, existem momentos em que é necessário uma parada para se descartar os pesos inúteis que carregamos, sejam eles um frasco de shampoo ou uma mágoa.

Dormi sem saber como meus pés estariam no dia seguinte.

Amanhecer em Puente La Reina

27 comentários:

Kátia A. C. disse...

Este choro que não me deixa td vez q venho aqui...
Vc, hoje, contou pouco...
...(depois de uma longa pausa pra pensar...)acho q somos duas maluquinhas...

bjo.

K.

Anônimo disse...

Excelente blog. Saludos desde Indiana, USA de José T. Espinosa-Jácome (Maylo)

Anônimo disse...
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mundo azul disse...

Quanta coisa se aprende... Estou gostando muito de acompanhar você na sua viagem!
Espero que tenha valido cada pequeno calo...

Beijos de luz e todo o meu carinho!!!

Unknown disse...

Você chorou por uma bolha, né? Sei... rs
Beijos peregrina!

Tell Aragão disse...

mulher...
sei que a gente tem que treinar o desapego... mas, travesseiro não dá... o shampoo, até poderia ser... mas, condicionador, nunca... você não té entendendo meu cabelo rsrs sem esse "detalhezinho", eu é quem choraria...
bjs

Unknown disse...

hahaha
hilária a sua descrição da alemã saindo do banheiro... acabei rindo alto em frente ao computador.
Me lembra a viagem que fiz de trem entre frança e itália. Dormimos no trem em uma daquelas cabines com duas beliches-gavetas bem apertadas. Como éramos três (eu, uma prima, irmão e uma tia) sobrou uma cama que foi ocupada por um italiano (ou seria um francÊs?). Não é que de noite ele desce da cama de cueca e meias até o joelho e fica andando no trem praticamente pelado! ficamos assustados com aquilo... enfim, diferenças culturais.

Vanuza Pantaleão disse...

Kátia,
Minha Doce Peregrina, se, por acaso, por loucura, ou excesso de sensatez, fores ao Himalaia, não, não te esqueças de me chamar,rsss...Pisciana e canceriana, somos semelhantes, viajantes na terra e caminhantes nas nuvens...Ninguém nos segura!
Obrigada, "moça do roseiral de Monet"... Um delicioso final de semana!Bjssss...Vou fazer teu link depois, aliás, é meu filho quem os organiza pra mim.
Uma dica de cinema:não deixe de ver o filme recente "Antes de Partir" com Jack Nickolson e Morgan Freeman. Tem tudo a ver com o que gostamos, te garanto!

Vanuza Pantaleão disse...

Olha, colei uma imagem daqui para a nossa galeria permanente, posso? Sei que posso...

Vanuza Pantaleão disse...

Obrigada, Kátia!
As imagens e selos ficam na lateral do post, sempre vão aparecer e para lá irá, por enquanto, essa imagem que você me presenteou (não conta pra ninguém, mas foi com a Rê que peguei essa mania,rsss). Eu tenho que voltar aqui, COM CERTEZA, para fazer um passeio por todos os teus posts, se Deus quiser, Ele há de querer! O JARDIM DE MONET? Esse não vai me escapar...Mas, não deixe de ir ao Himalaya (escrevo com y, é frescura,rsss) e se não me levar, traga-o para nós!!!
(filmaço, hein?)

Anderson Meireles disse...

Querida Kátia, fico muito feliz que minhas humildes palavras tenham falado com vc...
A luz é assim mesmo...ilumina, aquece e nos abre os olhos,
um abraço!

Vanuza Pantaleão disse...

Risosss...E eu? O que sou? Pior, ninguém descobriu ainda...Ah, tá melhor que orkut e msn, com certeza!
Queres "Selos de Poeta"? Não existem. Drummond os teve? Pessoa? Quintana? Chico Buarque?Cecília? Por aí...Tá vendo? Estás em boa companhia...Mas, se isso te conforta a alma, vai lá, leva aqueles meus (meus?) que os queridos Rê e Anderson e agora a Sam me deram e sei lá porque! Enfim...Fica em PAZ!!!Aiiiii, essa vida...

mundo azul disse...

Espero que os pés já tenham melhorado!
Passei para deixar um beijo e desejar um final de semana muito feliz!!!

Deusa Odoyá disse...

Oi minha amiga Katia.
Passei para lhe desejar um final de semana com muita paz e descanso.
quanto a sua bolha, espero que tenhas se recuperado dela.
Obrigado, por seus comentários sempre alegres em meu cantinho, mas nosso amigo, acho que não gostou dos meus.
Deixa pra lá.
na próxima viagem te acompanharei, pois agora só a acompanho em blog.
Beijos amiga.

aproveite e fique na paz.

Regina Coeli.

Dauri Batisti disse...

Passei para deixar um abraço. Bonito ver você relatando suas peregrinações. A busca de si mesmo sempre rende belas aventuras... e bolhas.

AugustoMaio disse...

Belas terras, tal como as fotos e o blog. Dá gosto.

Nadezhda disse...

Chega uma hora, tanto nessas caminhadas quanto na vida que é difícil fingir que não se sente fatigado, e sai tudo de uma vez só. O choro, a tristeza.

Mas o final sempre compensa ;)

Anônimo disse...

Mas tem coisa pra ler..srrsrs
Nossa..delicia eses relatos....

Beijos Katia...
Val

* não lembro senha de meu blog...kkkkkkkkkkkk

RENATA CORDEIRO disse...

Quanto mais a leio, mais a admiro, pois jamais faria isso. Amiga, acabo de publicar algo de belo. Um post feito a várias mãos, ou seja, vários colegas da Blogosfera contribuíram para esta postagem. Venha apreciá-lo.
wwwrenatacordeiro.blogspot.com
Um beijo,
Renata

Anderson Meireles disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anderson Meireles disse...

Estava no blog da Vanuza e li um comentário seu, que descobriu no meu que não é poeta...
Quem disse que não?
Se você é uma pessoa que divulga as coisas belas da vida, faz de momentos insignificantes, eventos históricos...você é poeta sim..
Me explica isso direito!! Rsrs..
Um abraço!

Vanuza Pantaleão disse...

Falei que voltava, não falei? Já colamos por lá os "chorões" de Monet, divinossss...Obrigada, de coração!
Agora, se me permite, vou passear por aqui, curtir contigo pelos caminhos por onde passaste...
Kátia, uma tarde de PAZ, minha Amiga! Bjsssss

Jacinta Dantas disse...

Ei Kátia,
está sendo muito legal te acompanhar nessa viagem-recordações que você faz. E, gostoso na leitura, é sentir o que fica de bom humor, aprendizado e auto-conhecimento.
Beijos
Jacinta

Dry Neres disse...

Você é linda.. tuas histórias são perfeitas.. poesia por trás da prova.. mágico!
Um beijo, querida! =)

meus instantes e momentos disse...

Te lendo, parece que estou viajando por aí. Teu blog é viajar. Muito bom.
Maurizio

Anônimo disse...

...Numa época eu me associei ao Albergue da Juventude ja pensando em conehcer esse ambiente...qundo viajo sempre procuro ficar em um...alem de seguro e bom atendimento, tem esse convivo com diferentes culturas...Jpa fiquei no mesmoo quarto com mulheres Austriacas, Chilenas, Argentinas, Autralianas, Americanas e Neo-Zelandesa...com comportamentos bem diferente das brasileiras

Anônimo disse...

..ah, tenho que conhecer a Ermida de Nuestra Señora de Eunate..ta anotado